POR JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI
No dia vinte de junho celebramos o Dia Mundial do Refugiado e o Dia do Migrante, datas comemorativas que nos levam a refletir sobre estes fenômenos (imigratório e migratório), que não podem ser vistos apenas como deslocamentos geográficos de indivíduos, nem mero exercício do direito de ir e vir. Eles envolvem aspectos sociais, políticos e culturais, que suscitam proteção jurídica especial.
Para atender às necessidades das populações sofridas que acabam injustamente sendo perseguidas a ponto de abandonarem suas Nações, criou-se, em 1945, após a Segunda Guerra Mundial, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). A iniciativa, que se destinava a proteger as vítimas da guerra, acabou por tornar-se um serviço permanente devido à dura realidade de conflitos e perseguições internacionais, sendo firmada a Declaração de Cartagena, estabelecendo a partir de 1964, os direitos e deveres dos refugiados.
Segundo relatório dessa entidade, o número de refugiados no mundo passa de quatorze milhões. Trata-se de uma situação que contraria manifestamente os direitos fundamentais dos indivíduos, pois aqueles que deixam suas pátrias forçados por perseguições de raça, de religião, de nacionalidade, de grupo social e de opiniões políticas e que se sentem temerosos e excluídos, acabam por perder as próprias raízes e são obrigados a fugir e a buscar asilo em outros países. Esse quadro mostra a necessidade da solidariedade da sociedade organizada na tentativa de amenizar o problema, principalmente em nosso país que há décadas constata grandes migrações internas, sendo alvo de numerosos imigrantes de outras localidades, recebendo ainda, um considerável número de refugiados. De acordo com Luiz Paulo Teles Barreto e Luis Varese, “a lei brasileira sobre refúgio (nº 9.474, de 22/07/1997) é considerada pela ONU uma das mais modernas, abrangentes e generosas do mundo. Seu texto contempla todos os dispositivos da proteção internacional aos refugiados, incorpora as razões de refúgio consagradas universalmente e inova ao beneficiar também quem deixa seu país em busca de abrigo devido a graves e generalizadas violações de direitos humanos - muito comuns em casos de conflitos armados” (Folha de São Paulo, 22/06/2010- p. 03).
Nesse contexto, conforme dados extraídos de matéria publicada pelo jornal “O Estado de São Paulo” (20/06/2007- p. A18), após manifestar o desejo de permanecer no Brasil como refugiado, o imigrante é encaminhado à Polícia Federal e depois à Cáritas Arquidiocesana de São Paulo ou do Rio de Janeiro, conveniadas com o Acnur e que dispõe de três programas principais de atendimento: proteção (cuidando dos aspectos jurídicos e regularização de documentação), integração (cursos de português e profissionalizante) e assistência social (moradia, alimentação e saúde). O processo de aprovação dura cerca de três meses e nesse período o imigrante passa por duas entrevistas, que depois são analisadas por representantes do Acnur, do Comitê Nacional dos Refugiados (Conare), ligado ao Ministério da Justiça, e da sociedade civil (Cáritas). Nesse tempo, os solicitantes ficam em albergues determinados e fazem cursos de idiomas e profissionalizantes. Aprovados, recebem um Registro Nacional de Estrangeiros (RNE), renovável a cada dois anos e passam a ter os mesmos direitos dos estrangeiros que residem legalmente em nosso país. Recebem ainda por seis meses uma ajuda de subsistência no importe de um salário mínimo.
Embora o ideal fosse o de um mundo sem perseguidos nem refugiados, é gratificante constatar que o Brasil está ciente de suas responsabilidades na proteção internacional às vítimas desta intolerância e de possuir uma política clara, honesta e generosa sobre o tema, embora às vezes cometa alguns deslizes, motivados mais por paixões políticas de alguns agentes da Administração Pública do que por nossas orientações normativas, como ocorreu com os boxeadores cubanos nos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro, sumariamente deportados, sem que seus pedidos de asilo político fossem analisados. Esperamos que essas condutas não se repitam, sob pena de prejudicarem os avanços obtidos e manifestamente adequados aos ideais democráticos e de defesa dos direitos humanos. Com efeito, os fenômenos imigratório e migratório não podem ser vistos como simples deslocamentos geográficos de indivíduos, nem como mero exercício do direito de ir e vir. Eles envolvem aspectos sociais, políticos e culturais, que suscitam proteção jurídica especial.
Os refugiados, que deixam suas pátrias forçados por perseguições de raça, de religião, de nacionalidade, de grupo social e de opiniões políticas, sentem-se temerosos e excluídos, e acabam perdendo as próprias raízes. Trata-se de uma situação que contraria manifestamente os direitos fundamentais dos seres humanos.
*JOÃO CARLOS JOSÉ MARTINELLI é advogado, jornalista, escritor e professor universitário.
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