domingo, abril 22, 2012

Negro, Branco ou Pardo? O STF decidirá sobre a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade das cotas raciais em universidades públicas


Por Aldir Guedes Soriano

Conforme matéria publicada no site Consultor Jurídico e assinada por Rodrigo Haidar, o Supremo Tribunal Federal – STF decidirá sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade das cotas raciais adotadas por universidade públicas brasileiras no dia 25/04, quarta-feira próxima.
Duas ações foram ajuizadas sendo que em uma delas o DEM, em sede de Arguição de Preceito Fundamental (ADPF), questiona a reserva de 20% das vagas oferecidas pela Universidade de Brasília a partir de critérios étnicos-raciais. Na outra ação, um candidato que se sentiu prejudicado no processo seletivo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, contesta o sistema de cotas raciais adotado pela instituição de ensino, mediante Recurso Extraordinário (RE no 597.285).[1]

Desvirtuamento dos direitos civis nos EUA
            Segundo o professor emérito da Universidade de Stanford, Thomas Sowell,  igual oportunidade – perante as leis e as políticas públicas – requer que indivíduos sejam julgados segundo as suas qualificações como indivíduos, sem consideração à raça, ao sexo ou à idade. Ações afirmativas requerem que as pessoas sejam julgadas por pertencerem a certos grupos, recebendo, por isso, tratamento preferencial ou compensatório.  Esse notável intelectual afrodescendente demonstra que os direitos civis nos Estados Unidos foram desvirtuados: from equal opportunity to affirmative action.[2]
Sowell, após minucioso estudo, escreveu inúmeros livros demonstrando os efeitos contraproducentes das ações afirmativas.

Inconstitucionalidade         
Adoções de cotas raciais nos vestibulares são inconstitucionais, porquanto a Constituição de 1988 estabelece que o “ensino será ministrado com base”, dentre outros, no princípio da “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, art. 206, I, da CF. Assim, o único critério válido nos processos seletivos é o da meritocracia.
Além de injustas e inconstitucionais, as cotas raciais se prestam apenas para dividir a sociedade segundo a cor da pele de seus cidadãos, propiciando assim a criação de um regime de apartheid.  Existem deletérios efeitos colaterais à medida que o cidadão deve declarar a tonalidade de sua pele, como observa Demétrio Magnoli. Ao adotar critérios raciais para a reserva de vagas, a universidade pública obriga o candidato a se definir racialmente pela primeira vez na vida. Assim, o jovem tem que declarar a sua raça: branco, negro, ou pardo. Segundo diversos autores, a autodeclaração racial pode levar a uma perigosa racialização ou divisão do Brasil segundo a dicotomização da cor/raça.[3]

Lógica do razoável
Curiosamente, Luiz Flávio Gomes publicou anos atrás o artigo: “Na dúvida, condena-se o réu mais feio”.[4] Esse interessantíssimo trabalho baseia-se em estudo divulgado pela BBC de Londres no qual os feios têm mais chances de serem condenados criminalmente do que os bonitos. Se a ponderação da razoabilidade fosse completamente afastada e houvesse uma banalização das affirmative actions, não haveria limites para a instituição de cotas preferenciais nas universidades e no mercado de trabalho. Assim sendo, deveríamos também admitir cotas para os gaguinhos, gordinhos, feinhos e disléxicos. Em alguns desses casos com alguma razão, pois certamente as pessoas mais feias ficam em desvantagem, por exemplo, no momento da entrevista para se conseguir emprego. Deveríamos tratá-las de forma desigual?
Certamente não é o caso de se justificar a adoção de cotas raciais discriminatórias com a aplicação da regra de se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam, difundida entre nós por Rui Barbosa. Neste caso, é flagrante a violação da lógica do razoável.  Assim, essa regra do tratamento desigual entre desiguais não pode ser aplicada. Em outros casos, todavia, seria razoável admitir a sua aplicação. Consideremos apenas o seguinte caso, que, aliás, é baseado no exemplo de Recaséns Siches, autor mexicano, que brilhantemente desenvolveu a doutrina da lógica do razoável. Tratar diferenciadamente pessoas cegas, permitindo a sua entrada no supermercado sob a guia de seus cães é evidentemente razoável, pois não restringe o direito das demais pessoas de forma importante por não poderem entrar com seus cães de companhia. Observa-se que, apesar do tratamento desigual, ambos os grupos podem exercer igual direito de entrar na loja, sem qualquer prejuízo significativo. Por outro lado, não se pode sustentar a lógica do razoável nas discriminações fundadas em cotas raciais nas quais os desiguais são tratados de forma desigual, pois é notório o prejuízo para os desprivilegiados – vestibulandos ou aspirante a cargos públicos; que são barrados no processo seletivo em razão da cor de sua pele, aparentemente destoante do grupo favorecido. Isso não é outra coisa senão discriminação racial.

Conclusão
Discriminações raciais são más intrinsecamente consideradas e não podem ser purgadas ou mesmo justificadas sob o pretexto de se reparar erros históricos ou discriminações que ocorreram no passado.
Cotas raciais, no entanto, são inconstitucionais, violam o princípio da igualdade e não passam pelo crivo da lógica do razoável. Assim tais discriminações raciais são absolutamente injustificáveis.

Notas:


[1] HAIDAR, Rodrigo. STF decide sobre cotas raciais na quarta-feira. In: Consultor Jurídico. .

[2] SOWELL, Thomas. Civil rights: rhetoric or reality. New York: Quill, 1984, pp. 38-60.

[3] Cf. FRY, Peter; MAGGIE, Yvonne e outros. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.

[4] GOMES, Luiz Flávio. Na dúvida, condena-se o réu mais feio. Disponível em:http://www.blogdolfg.com.br . 06 junho.2007 http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2007060610153140.

Nenhum comentário: