Por
Aldir Guedes Soriano
Conforme matéria publicada no site Consultor Jurídico e assinada por Rodrigo Haidar, o Supremo Tribunal Federal –
STF decidirá sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade das cotas
raciais adotadas por universidade públicas brasileiras no dia 25/04,
quarta-feira próxima.
Duas ações foram ajuizadas sendo que em uma
delas o DEM, em sede de Arguição de Preceito Fundamental (ADPF), questiona a
reserva de 20% das vagas oferecidas pela Universidade de Brasília a partir de
critérios étnicos-raciais. Na outra ação, um candidato que se sentiu
prejudicado no processo seletivo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
contesta o sistema de cotas raciais adotado pela instituição de ensino,
mediante Recurso Extraordinário (RE no 597.285).[1]
Desvirtuamento
dos direitos civis nos EUA
Segundo o professor emérito da
Universidade de Stanford, Thomas Sowell, igual oportunidade – perante as leis e as
políticas públicas – requer que indivíduos sejam julgados segundo as suas
qualificações como indivíduos, sem consideração à raça, ao sexo ou à idade.
Ações afirmativas requerem que as pessoas sejam julgadas por pertencerem a
certos grupos, recebendo, por isso, tratamento preferencial ou
compensatório. Esse notável intelectual
afrodescendente demonstra que os direitos civis nos Estados Unidos foram
desvirtuados: from equal opportunity to affirmative action.[2]
Sowell, após minucioso estudo,
escreveu inúmeros livros demonstrando os efeitos contraproducentes das ações
afirmativas.
Inconstitucionalidade
Adoções de cotas raciais nos
vestibulares são inconstitucionais, porquanto a Constituição de 1988 estabelece
que o “ensino será ministrado com base”, dentre outros, no princípio da
“igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, art. 206, I, da
CF. Assim, o único critério válido nos processos seletivos é o da meritocracia.
Além de injustas e inconstitucionais,
as cotas raciais se prestam apenas para dividir a sociedade segundo a cor da
pele de seus cidadãos, propiciando assim a criação de um regime de apartheid. Existem deletérios efeitos colaterais à
medida que o cidadão deve declarar a tonalidade de sua pele, como observa
Demétrio Magnoli. Ao adotar critérios raciais para a reserva de vagas, a
universidade pública obriga o candidato a se definir racialmente pela primeira
vez na vida. Assim, o jovem tem que declarar a sua raça: branco, negro, ou pardo.
Segundo diversos autores, a autodeclaração racial pode levar a uma perigosa racialização
ou divisão do Brasil segundo a dicotomização da cor/raça.[3]
Lógica
do razoável
Curiosamente, Luiz Flávio Gomes
publicou anos atrás o artigo: “Na dúvida, condena-se o réu mais feio”.[4]
Esse interessantíssimo trabalho baseia-se em estudo divulgado pela BBC de
Londres no qual os feios têm mais chances de serem condenados criminalmente do
que os bonitos. Se a ponderação da razoabilidade fosse completamente afastada e
houvesse uma banalização das affirmative actions, não haveria limites para a
instituição de cotas preferenciais nas universidades e no mercado de trabalho.
Assim sendo, deveríamos também admitir cotas para os gaguinhos, gordinhos,
feinhos e disléxicos. Em alguns desses casos com alguma razão, pois certamente
as pessoas mais feias ficam em desvantagem, por exemplo, no momento da
entrevista para se conseguir emprego. Deveríamos tratá-las de forma desigual?
Certamente não é o caso de se
justificar a adoção de cotas raciais discriminatórias com a aplicação da regra
de se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que
se desigualam, difundida entre nós por Rui Barbosa. Neste caso, é flagrante a
violação da lógica do razoável. Assim,
essa regra do tratamento desigual entre desiguais não pode ser aplicada. Em
outros casos, todavia, seria razoável admitir a sua aplicação. Consideremos
apenas o seguinte caso, que, aliás, é baseado no exemplo de Recaséns Siches,
autor mexicano, que brilhantemente desenvolveu a doutrina da lógica do
razoável. Tratar diferenciadamente pessoas cegas, permitindo a sua entrada no
supermercado sob a guia de seus cães é evidentemente razoável, pois não
restringe o direito das demais pessoas de forma importante por não poderem
entrar com seus cães de companhia. Observa-se que, apesar do tratamento
desigual, ambos os grupos podem exercer igual direito de entrar na loja, sem
qualquer prejuízo significativo. Por outro lado, não se pode sustentar a lógica
do razoável nas discriminações fundadas em cotas raciais nas quais os desiguais
são tratados de forma desigual, pois é notório o prejuízo para os
desprivilegiados – vestibulandos ou aspirante a cargos públicos; que são
barrados no processo seletivo em razão da cor de sua pele, aparentemente
destoante do grupo favorecido. Isso não é outra coisa senão discriminação
racial.
Conclusão
Discriminações raciais são más
intrinsecamente consideradas e não podem ser purgadas ou mesmo justificadas sob
o pretexto de se reparar erros históricos ou discriminações que ocorreram no
passado.
Cotas raciais, no entanto, são
inconstitucionais, violam o princípio da igualdade e não passam pelo crivo da
lógica do razoável. Assim tais discriminações raciais são absolutamente
injustificáveis.
Notas:
[3] Cf.
FRY, Peter; MAGGIE, Yvonne e outros. Divisões perigosas: políticas raciais no
Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.
[4] GOMES,
Luiz Flávio. Na dúvida, condena-se o réu mais feio. Disponível em:http://www.blogdolfg.com.br
. 06 junho.2007 http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2007060610153140.
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