sexta-feira, janeiro 25, 2008

Artigo: Violência e a educação moral da humanidade

Por Aldir Guedes Soriano


Jacques-Louis David (1748-1825), famoso pintor da Revolução Francesa, foi, certa vez, questionado acerca dos aspectos violentos, feios e grotescos que, por vezes, são retratados em sua arte, especialmente no quadro “O assassinato de Marat”. Segundo a crítica, a arte deveria mostrar apenas o belo. David respondeu dizendo que a educação moral da humanidade está acima de sua arte.



O espanhol Francisco de Goya (1746-1828), que foi citado por David em sua resposta acima mencionada, notabilizou-se através de pinturas e gravuras sobre os horrores da guerra e da inquisição espanhola. Goya conseguiu reproduzir a atmosfera asfixiante, através da sombra e da luz, nas suas obras-primas como “O Santo Ofício”, “Cena de inquisição” e “A Procissão dos flagelados”, que até hoje produzem efeitos pedagógicos contra a violência, a opressão e a intolerância religiosa.

Hoje, os transcendentais de Aristóteles – beleza, verdade e bondade (bem) – podem ser percebidos através das obras do pintor francês revolucionário que estão expostas nos mais importantes museus do mundo. No Louvre, em Paris, crianças sentadas no chão contemplam a cena jactanciosa de “O coroamento de Napoleão I” enquanto são instruídas por uma jovem e entusiasmada professora. Não se pode duvidar, David ainda está contribuindo para a educação moral da humanidade.


Recentemente, diversos canais brasileiros de televisão mostraram cenas chocantes de uma velhinha que foi espancada, gratuitamente, pelo assaltante impiedoso. As imagens da ação criminosa desse Raskólhnikov moderno estão disponíveis no site do Youtube. No livro “Crime e Castigo” de Dostoievski, o jovem Raskólhnikov assassina uma velha indefesa com golpes de machado. Tal ato de crueldade o faz sentir grandioso, importante e acima do bem e da lei. Como é fácil a valentia diante de pessoa frágil e vulnerável!



Infelizmente não são poucas as correntes do pensamento político que desprezam ou deturpam a ética. A lista é grande, mas não se pode deixar de mencionar o utilitarismo, o maquiavelismo e o marxismo, que contribuíram para o desencadeamento das mais cruéis, desconhecidas e ignoradas experiências totalitárias do século XX, que ocorreram na União Soviética de Lênin e Stalin e na China de Mao Tsé-Tung. Segundo Rummel, mais de 83 milhões de pessoas foram assassinadas por esses três ditadores (Vide o livro “Death by government”, p. 8). Tais dados, levantados pelo cientista político da Universidade do Havaí, também são importantes para a educação moral humanidade. Além disso, o ditador Mao Tsé-Tung provocou a morte de pelo menos 40 milhões de chineses por inanição, com o confisco da produção agrícola e o assassinato, em massa, de inúmeros proprietários de terra (Vide o livro “Nine Commentaries on the communist Party”, p. 207).

David estava certo. A educação moral deve ser colocada acima da arte. Essa educação também deve ser colocada acima da literatura, da ideologia e, até mesmo, do jornalismo. Cenas de violências podem ser mostradas com propósito de impactar positivamente a opinião pública e provocar o surgimento de sentimentos superiores de piedade, como a compaixão, a bondade e a misericórdia. Criminosos, assassinos e sociopatas normalmente não possuem esses sentimentos, mas talvez eles possam ser influenciados através educação moral.

A grande mídia tem o dever, pelo menos do ponto de vista ético, de promover a educação moral da sociedade e de oferecer informações factuais e verídicas. Até mesmo as cenas de violência podem ser edificantes dependendo da forma como são apresentadas.

O Estado pouco pode fazer além de punir os crimes de violência, mas a arte, a literatura, a religião e a mídia, se bem-intencionadas, podem atuar mais profundamente na raiz do problema que está no coração humano, promovendo a educação moral da humanidade. É lícito ao Estado o ensino dos valores humanistas e pacifistas, mas, por outro lado, existem embaraços constitucionais para o ensino de valores religiosos, em razão de seu caráter laico e das liberdades públicas asseguradas pela democracia.

Texto publicado no jornal Oeste Notícias, em 17 de janeiro de 2007.

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