quinta-feira, dezembro 29, 2011

Artigo: Resistência aos inimigos da liberdade

Por Aldir Guedes Soriano

Artigo originalmente publicado no Jornal Folha de S. Paulo,
Tendências/Debates, em 24 de dezembro de 2011.

Certamente ainda existem os inimigos profissionais da liberdade de que falava o jurista Rui Barbosa. São agentes que trabalham incansavelmente contra a autonomia da consciência individual, arrastando nesse propósito autoritário uma multidão de obreiros inconscientes e alienados da realidade.

Impulsionados pela "libido dominandi", os inimigos profissionais da liberdade pretendem impor a autonomia do consenso coletivo. Nesse campo, não é lícita a intromissão do poder político. A consciência religiosa ou ateia deve permanecer livre de qualquer forma de coerção.

Regular as relações interpessoais com o fim de promover a pacífica convivência social é papel do Estado, mas há limites.

No Estado democrático de Direito, o poder estatal é limitado pelos direitos fundamentais e pela autonomia da consciência individual.

Por defender o princípio da liberdade religiosa, Rui Barbosa atraiu a animosidade dos ultramontanos e foi considerado inimigo da religião. Ao perseverar na defesa dos princípios liberais, Rui teve que se exilar em Londres.

É importante reconhecer que a luta pela democracia passa pela defesa da liberdade religiosa. Não pode subsistir a democracia sem essa liberdade pública.

Remanesce, hoje, a necessidade de defesa desses princípios liberais como forma de resistência à autonomia da consciência coletiva, ao fanatismo e à intolerância religiosa. A tese da universalidade dos direitos humanos não pode ser superada pelo relativismo cultural, atualmente promovida em conferências realizadas no Irã e em outros países teocráticos.

Direitos fundamentais não podem ser violados em nome do relativismo cultural. É preciso defender urgentemente a tese da universalidade dos direitos humanos ao redor do mundo, e até mesmo no âmbito das Nações Unidas.

No Irã, os bahá'ís são sistematicamente perseguidos e não podem exercer o direito à educação superior. Ao redor do mundo, um cristão é morto a cada cinco minutos, em razão de virulentas perseguições religiosas. Recentemente, em uma única noite, 500 cristãos foram assassinados em uma pequena aldeia na Nigéria, por fanáticos religiosos munidos de facões e armas de fogo. Mulheres apanhadas em adultério são punidas com apedrejamento.

Enfim, nos diversos países teocráticos, a pena de morte é aplicada contra aqueles que mudam de religião ou que manifestam alguma dissidência em relação à religião oficial do Estado.

Rui Barbosa era apaixonado pelo liberalismo político e pela liberdade. Herdou esse legado de seu pai, João Barbosa.

A liberdade religiosa está na origem e no âmago de todos os demais direitos fundamentais da pessoa humana. Essa liberdade, segundo Rui, é inata ao homem, pacífica, civilizadora e filha do evangelho.
Diante dos grandes desafios e ameaças à consciência individual, por que não promover o princípio democrático da liberdade religiosa?

É preciso promover os princípios liberais como uma forma de resistência contra a opressão, o fanatismo e a tirania.

ALDIR GUEDES SORIANO, advogado e membro da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB-SP, é coordenador da obra coletiva "Direito à Liberdade Religiosa - Desafios e Perspectivas para o Século 21".
................................................................................

3 comentários:

Anônimo disse...

penso que não somos o mesmo o tempo todo (sangue, células, cabelos, pensamentos, mudam sempre)
criança não pensa como jovem
adulto não pensa como velho
mudamos o tempo todo.
COMO IMPOR, nessa condição, uma idéia de certeza absoluta, sem não a entendemos, nem a mantemos sempre a mesma? ao contrário, sempre está em constante mudança, assim como o clima, a saúde, a idade, o humor, a fome, o interesse...

Aldir G. Soriano disse...

A pessoa que fez esse comentário está absolutamente correta ao dizer que estamos constantemente em mudança. Porém, a despeito das mudanças temos sempre as mesmas necessidades: alimento e água para manutenção da vida e liberdade para manter o equilíbrio mental e emocional. Daí a a relevância dos direitos fundamentais que buscam assegurar condições mínimas para que a pessoa humana possa subsistir. O comentário é relevante, lamento apenas o anonimato.

Gleice Chada disse...

Professor, onde posso conseguir um exemplar de sua Obra Liberdade Religiosa no Direito Constitucional e Internacional, pois estou realizando meu trabalho de conclusão do curso de Direito e não estou conseguindo aqui no Rio de Janeiro um exemplar. Se puder me orientar agradeço imensamente.
Gleice Chada.